
A história que vos venho contar é muito mais do que uma história de encantar. É uma história de amor, porque o amor não é só coisa de gente crescida. Aliás, há muita gente que não conhece este tipo de amor.
Iniciemos, então: um palácio esquecido, um zambujeiro envelhecido e uma menina aborrecida.
De braço a apoiar a cabeça, a menina olhava a paisagem da janela que todos os dias se abria sob um vale imenso, se estendia até ao rio, coberto de mato bravo e um canavial que percorria as margens de uma ribeira. Para lá da ribeira podia ver-se aquilo que eram os restos mortais de um edifício muito, mesmo muito antigo, e uma oliveira, também ela desgastada pelo passar dos anos. A menina olhava, mas não via e, por
isso, a sua vida era sempre igual, sem graça, dia após dia.
Contudo, sem se aperceber, sem sequer poder imaginar, ela era o tema da conversa do velho zambujeiro e do palácio antigo.
Zambujeiro: Oh velho companheiro, já ninguém se lembra de nós, longe vai o tempo em que ao nosso redor não faltava vida! As lavadeiras a lavarem a roupa na ribeira, os homens que apanhavam a minha azeitona, as mulheres que colhiam flores para o ramo de espiga; bois que aravam estes campos, enfim
Palácio: Pois, pois, mas quando aqui me ergueram parece que não fui lá muito do teu agrado.
Zambujeiro: Sabia lá eu o que estavam a engendrar!
Primeiro, foi um cavaleiro que aqui parou e ficou a olhar o horizonte com ar sonhador; dias depois, apareceram carroças cheias de pedra e homens a barafustar com grandes folhas de papel na mão, a apontar para aqui e para ali, era, no mínimo, assustador! Eu só pensava: “Ai meu Deus, o que é que vem aí?"
Palácio: Confessa lá, oh zambujeiro, o que veio agradou-te!
Zambujeiro: Olha, olha, lá estás tu com a mania das grandezas!
Palácio: Mas, eu já fui importante, muito importante! Agora, estamos para aqui perdidos e lá se foi a importância toda! Importantes seríamos se aquela
menina acordasse, passa o tempo à janela, se pelo menos olhasse para nós.
Zambujeiro: Temos de fazer algo. Vamos chamá-la!
Palácio: Mas como? Se nem acenar podemos, tu, sem folhas e com os troncos enfraquecidos e eu, ai eu para aqui cheio de buracos e telhas partidas, a cair aos pedaços, só vivo mesmo em alma o coração, ai esse nem quero falar nisso!
Zambujeiro: Olha, já sei! Eu estou velho, mas ideias não me faltam. Que tal se uníssemos forças e atirássemos uma pedra podia ser que ela nos visse.
Palácio: Mais uma, dizes tu, das poucas que me restam.
Quando o meu senhor me fez erguer, nem uma ficou
fora do sítio. Tudo tão bem feitinho que ficou um primor!
Zambujeiro: Belos tempos que já lá vão! Quem diria que por aqui passou gente nobre do nosso país? Nem eu sonhava que aquele cavaleiro, Jorge de Barros, era um homem tão importante!
Palácio: Ai que saudades que eu tenho! E o tanque, cuja água regava os bonitos laranjais e as hortas?!... Esse meu companheiro que tão fielmente refletia, nas suas águas, a minha imagem, era nele que eu me via e revia morreu, mesmo à nossa frente, sem nada podermos fazer para construírem uma estrada vê lá tu bem, meu velho zambujeiro, uma estrada o progresso também traz destas coisas.
Atiraram uma pedra, mas caiu mesmo no meio da
ribeira. Teria que ser alguma coisa mais forte que fizesse barulho, talvez.
Zambujeiro: Que tal as abóboras? – sugeriu o zambujeiro.
É que aquele palácio tinha os parapeitos da varanda cheiinhos de abóboras. Um caseiro deixara-as lá ficar e ainda existiam.
E assim foi. Naquela noite, enquanto a menina dormia descansada, o zambujeiro deu um encontrão no amigo e todas as abóboras rolaram da varanda, de tal maneira que o estrondo foi tão grande que fez acordar a menina.
Menina: Que barulho foi este? Terá sido um pesadelo?
A menina correu à janela, mas, como era de noite nada viu.
De manhã, logo que o sol espreguiçou os seus raios, depois de se aprontar e de tomar o pequeno-almoço, saiu de casa e pela primeira vez, pela primeiríssima vez, desceu o vale em busca de qualquer pista capaz de lhe satisfazer o formigueiro que sentia na barriga.
Menina: Bem, que lugar maravilhoso, pena estar tão abandonado.
A menina aproximou-se e, à medida que se aproximou, reparou numa quantidade de abóboras espalhadas em redor daquela casa velha.
Menina: Meu Deus, que terá acontecido aqui para estas abóboras terem caído da varanda?
Foi então que, como por magia, uma voz entristecida soou ao seu ouvido:
Palácio: Olá, estou aqui, olha para mim.
Menina: Quem és tu? Uma casa que fala?!!!!
Palácio: Muito prazer, sou a casa da Quinta de Vale de Flores, ainda que muitos me achem um palácio pela minha imponência e idade – quase cinco séculos!
Menina: A sério? E como é que chegaste a esse estado?
Palácio: Bom, essa é uma longa história mas, antes de a desvendares, quero apresentar-te um velho amigo e meu único companheiro dos últimos anos.
Zambujeiro: Muito prazer!
Menina: Mas, o que é isto? Esta quinta está encantada
ou quê? Agora as oliveiras também falam???
Zambujeiro: Verdade! Esta quinta tem encanto e por isso nós te chamámos até aqui.
Menina: Queres dizer que a queda das abóboras foi uma estratégia vossa?
Zambujeiro: Pois foi, tu és a nossa esperança! Nós fazemos parte da história deste lugar, da história será também ela esquecida e morrerá connosco, com o fim dos nossos dias que está para muito breve.
Palácio: Sabes, estas abóboras já têm quase meio século e ainda existem por uma única razão. Elas guardam um segredo.
Menina: Verdade?!!! E que segredo é esse?

Bem...
Há muito tempo atrás, no tempo de D. Dinis, a
rainha que morava dentro de mim casou-se. Um dia houve uma guerra .
Quando dei por mim já estava todo partido. Antes de morrer , a rainha deu-me uma semente e, como não consegui agarrá-la um rei roubou-a e levou-a para muito longe .







E agora?
Agora procuramos alguém que nos possa ajudar. Ajudas- nos?

Claro!!!Onde é?

Eu não me lembro. Lembras-te, Zambujeiro?
Sim, lembro-me. Estás a ver o rio do bosque, ali ao
fundo?
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A história que vos venho contar é muito mais do que uma história de encantar. É uma história de amor, porque o amor não é só coisa de gente crescida. Aliás, há muita gente que não conhece este tipo de amor.
Iniciemos, então: um palácio esquecido, um zambujeiro envelhecido e uma menina aborrecida.
De braço a apoiar a cabeça, a menina olhava a paisagem da janela que todos os dias se abria sob um vale imenso, se estendia até ao rio, coberto de mato bravo e um canavial que percorria as margens de uma ribeira. Para lá da ribeira podia ver-se aquilo que eram os restos mortais de um edifício muito, mesmo muito antigo, e uma oliveira, também ela desgastada pelo passar dos anos. A menina olhava, mas não via e, por
isso, a sua vida era sempre igual, sem graça, dia após dia.
Contudo, sem se aperceber, sem sequer poder imaginar, ela era o tema da conversa do velho zambujeiro e do palácio antigo.
Zambujeiro: Oh velho companheiro, já ninguém se lembra de nós, longe vai o tempo em que ao nosso redor não faltava vida! As lavadeiras a lavarem a roupa na ribeira, os homens que apanhavam a minha azeitona, as mulheres que colhiam flores para o ramo de espiga; bois que aravam estes campos, enfim
Palácio: Pois, pois, mas quando aqui me ergueram parece que não fui lá muito do teu agrado.
Zambujeiro: Sabia lá eu o que estavam a engendrar!
Primeiro, foi um cavaleiro que aqui parou e ficou a olhar o horizonte com ar sonhador; dias depois, apareceram carroças cheias de pedra e homens a barafustar com grandes folhas de papel na mão, a apontar para aqui e para ali, era, no mínimo, assustador! Eu só pensava: “Ai meu Deus, o que é que vem aí?"
Palácio: Confessa lá, oh zambujeiro, o que veio agradou-te!
Zambujeiro: Olha, olha, lá estás tu com a mania das grandezas!
Palácio: Mas, eu já fui importante, muito importante! Agora, estamos para aqui perdidos e lá se foi a importância toda! Importantes seríamos se aquela
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